Como diria o Conselheiro Acácio, "há gosto para tudo". Ainda hoje, há piracicabanos esquivando-se de auxiliar a recuperação do "Nhô Quim", sem se dar conta do patrimônio cultural e histórico que o clube é da cidade. E atração turística. Quando se deixa escapar o precioso, como fazer planos que não sejam apenas secundários?
Há 40 anos - num 1967 confuso e agitado - deu a louca no Rípoli, outra louca. E - desafiando tudo e todos, acho que até a lei da gravidade - ele decidiu levar o glorioso XV excursionar pela Europa. Foi um escândalo nos meios esportivos. Pois, naqueles anos, apenas dois clubes do Brasil tinham mercado no exterior: o Santos de Pelé e o Flamengo. O "Nhô Quim", quem era? Ora, crianças: o maior clube do mundo, com os melhores craques do universo. Pelo menos, segundo Romeu Italo Rípoli.
Em 1967, no Brasil, assumia o ditador do plantão, Costa e Silva, que nos presentearia com o AI-5. Havia guerrilha na serra do Caparaó e, da Bolívia, vinha a notícia amarga: Che Guevara fora morto. Uma esquelética Twiggy desfilava com a minissaia criada por uma certa Mary Quant. No Vietnã, Lindon Johnson dava show de morticínio. Para variar, Israel e países árabes brigavam: o judeu Moshe Dayan, em apenas seis dias, acabou com o exército de Nasser. Portanto, o mundo continuaria insosso, não fosse Rípoli ter levado o XV jogar na Europa...
Sabe-se lá que manobras ele fez, os coelhos que tirou a cartola. O fato é que o "Nhô Quim" se apresentou em cinco repúblicas soviéticas, o Caetano Rípoli deveria escrever detalhes da viagem maluca. Em dois meses, os caipiras de Piracicaba jogaram em Moscou, Kiev, Odesa, Taskend, no Ubesquitão, na Suécia, Polônia, Alemanha, Dinamarca, nos cafundós dos judas de lá. Até numa cidadezinha perto do Pólo Ártico.
Bem... É verdade que era o XV, mas não era lá bem o XV que viajava por lá. Num lugar, o time jogava com o nome de "Piracicaba F.C", em outro, aparecia o nome de São Paulo e eu não me admiraria - mas isso ninguém confirmou - se Rípoli tivesse apresentado o XV como a Seleção Brasileira de Futebol sem Pelé. Mesmo porque Pelé era simples detalhe, pois, para Rípoli, o Dito Cueca era melhor.
Na Suécia, Rípoli chegou ao clímax de sua proverbial prepotência. Numa aposta com jornalistas brasileiros, prometeu que faria o discurso final em sueco. E, aqui entre nós: ele não distinguiria o sueco do japonês. Mas promessa é dívida. Vai daí, Rípoli agiu: contratou uma tradutora sueca e passou a noite escrevendo - palavra por palavra, do português para o sueco - o discurso de sua glória. Não dormiu, amanheceu aprendendo a pronúncia de cada palavra. No dia seguinte - pimpão e sem ruborizar - falou em sueco para os gringos suecos. Ou melhor: em "suecês"
"Gênio, gênio!" - diziam telegramas de correspondentes brasileiros na excursão. Eram tempos em que, para jornalistas esportivos, quem falasse "good morning" esbanjava cultura. Mas criou-se a lenda: Rípoli, em sueco, saudara o Rei da Suécia. E, de sueco, ele não sabia sequer da Ingrid Bergmann. Mas o XV estava na boca do mundo. Enciumado, João Guidotti resmungou: "Isso é bafo de onça..."
Não vou contar mas, na Suécia, o Caetano arrumou uma namorada. Tudo acertado, o velho Rípoli impediu o romance: "Você tem apenas 17 anos, não pode." Só que, por lá, a história "de menor" era outra. O Caeta entrou de gaiato.
FOTO: Rípoli e o time do XV na visita a União Soviética em 1964 - Acervo Pessoal João Luís Almeida
TEXTO: Cecílio Elias Netto para "A Província"
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